Por Emilio Godoy, da IPS
México, 30/07/2008 A pandemia de Aids se mantém estável na América Latina e afeta com força os grupos vulneráveis, como homossexuais, homens que fazem sexo com homens e prostitutas, segundo o informe mundial divulgado ontem pela Organização das Nações Unidas. Os dados coletados durante 2007 indicam que na região houve 140 mil novas infecções, fazendo com que a quantidade de pessoas portadoras do vírus da deficiência imunológica humana (HIV), causador da Aids, totalizasse 1,7 milhão.
Além disso, o documento elaborado pelo Programa Conjunto das Nações Unidas sobre HIV/Aids (Onusida), informa que 63 mil pessoas morreram no ano passado devido a padecimentos relacionados com a pandemia. O diretor para a América Latina do Onusida, César Nuñez, disse na apresentação do informe que "não se trata de uma epidemia pequena e controlada", por isso recomendou uma forte ênfase nas medidas de prevenção.
O Brasil, com 800 mil casos, e o México, com 200 mil, aparecem com os maiores índices de prevalência da região, enquanto se alerta que a América Central e o Caribe também é uma zona com forte impacto da doença. No Caribe há 230 mil pessoas portadoras do vírus, 20 mil pessoas o contraíram no ano passado e outras 14 mil faleceram nesse mesmo período. No mundo existem 33 milhões de pessoas com HIV, a maioria em países da África subsaariana, segundo a pesquisa que a agência da ONU divulgou simultaneamente no México, Nova York, Genebra, Johannesburgo e Bancoc.
A apresentação antecede à XVII Conferência Internacional sobre a Aids, que acontecerá entre 3 e 8 de agosto na capital mexicana, prevendo-se a participação de 25 mil especialistas, ativistas e delegados de organismos nacionais e internacionais procedentes de 150 nações. O estudo da Onusida, no capítulo latino-americano, afirma que o sexo sem proteção no coletivo de homens que mantêm sexo com homens está muito presente no México, Equador, Peru, Bolívia e Colômbia.
Também alerta que em países como Bolívia e Peru o contágio tem muito a ver com a prática de sexo sem proteção e pelo uso de drogas injetáveis sem as precauções recomendadas pela entidade. Também se enfatiza o fato de se perceber uma feminização da epidemia. "Vimos que a quantidade de mulheres infectadas aumentou nos últimos anos e veremos isso com maior ênfase no futuro", alertou Núñez.
Mais de 30% dos doentes na região são mulheres. No México, cerca de 40 mil mulheres são portadoras do vírus. "É preciso aumentar a visibilidade da epidemia nas mulheres para promover práticas sexuais seguras e protegidas", disse Linda Adechar, diretora-geral da não-governamental Fundação Vihdha. Além disso, a tuberculose derivada das baixas defesas provocadas pelo vírus surge como a razão principal de morte entre os afetados pelo HIV.
"A doença continua sendo a principal causa de mortalidade nos grupos vulneráveis", destacou Phillipe Lamy, representante residente no México da Organização Pan-americana de Saúde. Núñez destacou que há um aumento importante na prevenção e no tratamento na América Latina, onde 390 mil pessoas recebem terapia anti-retroviral. Mas, outras 630 mil carecem desses medicamentos, ressaltou.
"O número de pessoas com tratamento anti-retroviral aumentou", destacou Núñez, insistindo na importância da prevenção. "Medidas como controle do sangue e aumento no uso de preservativo deram uma resposta animadora", explicou, por sua vez, Mauricio Hernández, vice-ministro de Prevenção da Secretaria da Saúde do México.
A luta contra o vírus encontra obstáculos desde seu aparecimento por fatores como estigma, discriminação, homofobia e falta de informação sobre a doença. Nesse sentido, um estudo de sete países latino-americanos, patrocinado pelo Centro Internacional de Cooperação Técnica em HIV e Aids do Brasil e pela agência de cooperação alemã (GTZ), destaca que, apesar de haver mais políticas governamentais e mais leis, a discriminação em relação aos infectados e a grupos vulneráveis permanece como um desafio transcendental.
O documento intitulado "A resposta ao HIV/Aids na América Latina do ponto de vista social", que será apresentado na Conferência do México, sugere que um dos maiores esforços exigidos dos países para lutar contra a epidemia é levar as pessoas das populações vulneráveis a um ponto de igualdade nas diferentes facetas da vida social. O informe, ao qual a IPS teve acesso e que foi coordenado pela Secretaria Geral da Faculdade Latino-americana de Ciências Sociais (Flacso), indica que na região praticamente todas as constituições mencionam o direito à não-discriminação, mas não em relação aos portadores de HIV nem aos membros dos coletivos gay, lésbico ou transgênico.
"A matéria trabalhista é das mais problemáticas já que é onde ocorre de forma sistemática a violação das normas que garantem o direito a não-discriminação que se oculta graças às reformas de flexibilidade trabalhista e às dificuldades de provar as demissões discriminatórias", diz o texto que inclui Argentina, Colômbia, Chile, El Salvador, México, Peru e República Dominicana. "No caso do HIV, a discriminação continua muito forte devido ao preconceito e à má informação sobre a infecção", disse à IPS José Aguilar, coordenador nacional da rede Democracia e Sexualidade.
A Pesquisa Nacional de Discriminação de 2005 mostrou que os dois grupos mais discriminados no México são os deficientes e os homossexuais. Em média, nove em cada 10 mulheres, deficientes, indígenas, homossexuais, idosos e pertencentes a minorias religiosas responderam ser alvo de discriminação por sua condição. Além disso, uma em cada três pessoas pertencentes a estes grupos afirmou sofrer discriminação o trabalho.
Alejandra Gil, presidente da não-governamental Associação em Apoio a Servidores, que apóia trabalhadoras sexuais de um bairro da capital mexicana, disse à IPS que a visibilidade dos grupos vulneráveis pode ajudar a combater o estigma e a discriminação. México, Peru, Colômbia, El Salvador, República Dominicana contam com órgãos multisetorias para abordar a questão do HIV, enquanto isso não ocorre na Argentina nem no Chile. E, ainda, todos os países estudados possuem planos nacionais contra a doença.
Os pesquisadores descobriram que o direito à não-discriminação apresenta lacunas e contradições nas normas existentes nos países estudados. "Enquanto por um lado o Estado tenta combater o estigma das pessoas que vivem com HIV, por outro mantém leis e instituições que são discriminatórias dos coletivos em situação de vulnerabilidade a respeito do HIV", diz o documento. "O estigma e a discriminação seguem sendo fatores muito fortes", destacou Núñez.
A análise da Flacso revela, em relação à proibição em geral da discriminação no trabalho, que alguns marcos legais latino-americanos estabelecem este tipo de contravenções mas o que reina é a omissão. "Precisamos de espaços de trabalho livres de estigma e discriminação", disse Adechar. Outro estudo, patrocinado pela Aliança Internacional contra o HIV-Aids e que também será apresentado na Conferência, concluiu que as organizações de luta contra a doença ganharam mais presença e influência políticas, mas contam com menos recursos financeiros para execução de seus projetos, em 10 nações latino-americanas. (IPS/Envolverde)
(Envolverde/IPS)
http://envolverde.ig.com.br/materia.php?cod=50296&edt=1
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enviado por Ana Maria C. Bruni
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